quarta-feira, maio 02, 2018

Histórias que inspiram e motivam, conte a sua


O meu post “Tu tens câncer” – sobre a superação a quatro cânceres - dedicado às guerreiras e guerreiros que enfrentam e que poderão vir a enfrentar essa doença teve reacções interessantes. Se é verdade que todas tiveram o seu impacto, chamou a minha particular atenção as histórias de combatentes que li. Gostei de saber que aquele post animou, motivou e ajudou a muitos.

Recuso, no entanto, qualquer heroismo por, entre outros factores, haver gente que também serviu de motivação para mim e muitos que continuam a sê-lo. E creio que para todos.

                                                                  Allyson Allred (Foto: al.com)

Na terça-feira, 1, vi uma reportagem na NBC sobre quatro mulheres que sofreram um raro câncer no olho, quando eram, todas, estudantes numa universidade nos Estados Unidos. Mas a minha atenção particular foi para Allyson Allred, que, em 17 anos, já enfrentou esse câncer em sete ocasiões. Uau! Que guerreira de resistência, que me deixou sem palavras há mais de 24 horas.

João Carlos Martins era um exímio pianista brasileiro e, com pouco mais de 20 anos, um dos mais aclamados do mundo, com apresentações em Carnegie Hall, em Nova Iorque, por exemplo. De repente, numa partida de futebol teve três dedos atrofiados. Mais tarde, durante um assalto, uma pancada provocou numa lesão que cortou a comunicação entre o cérebro e a mão direita. Teve um tumor na mãe esquerda.  Com o passar dos anos deixou de tocar piano como fazia e passou a maestro, sendo um dos mais conceituados na actualidade. Passou por 22 cirurgias!! Isto mesmo, 22 cirurgias. Guerreiro de persistência!

João Carlos Martins (Foto: uol.com.br)

Na comunidade de fé a que assisto, há uma senhora que passou três anos numa cama de hospital. Três anos, sim. Hoje, vejo-a a conduzir um camião, apesar de ter pouco mais de metro e meio de altura. Guerreira de coragem.

A Valéria, minha esposa, teve um acidente aos 16 anos e os médicos disseram que ficaria paraplégica e que não poderia engravidar-se. Agora, depois de três filhos, quando os médicos olham para a sua história e por outras situações pelas quais passou, perguntam por que não está numa cadeira de rodas. Guerreira de fé.

Valéria e os filhos (Foto: ALA)

Os obstáculos que surgem à nossa frente são desafios, não impedimentos, que estimulam a nossa imaginação, persitência, esforço, foco e fé.

Acreditar no impossível, no entanto, é um desafio que ultrapassa a nossa mortalidade e só um conhecimento profundo de Deus permite-nos entender a profundidade de acreditar ser possível transformar o “impossível em possível”. Este processo não é um simples acto mecânico de passar a crer, mas um profundo mergulho na essência de Deus, que decorre de uma vivência com o Criador.


São histórias que inspiram, de gente que lutou e que luta contra as mais adversidades da vida.  Conte a sua!

domingo, abril 29, 2018

"Tu tens câncer", a frase de guerreiras e guerreiros


Há cerca de um mês que trago um certo peso na alma e na mente: endereçar algumas letrinhas às guerreiras e guerreiros que lutam contra o câncer (continuo a recusar escrever cancro, parece-me ter uma carga sonora muito pejorativa!!!).

Nos ultimos dias, recebi a notícia de mais pessoas que ouviram a terrível frase “tu tens câncer”. Sendo assim, aproveito para enviar uma palavra de motivação, ânimo e incentivo a esses combatentes.

Para aqueles que não sabem,  pela graça de Deus e pelos bons cuidados médicos a que tive acesso, sou sobrevivente de quatro cânceres (bexiga, pâncreas e nas duas mamas), mas nenhum relacionado com o outro, sem metátese e sem qualquer explicação médica, mesmo depois de dois exaustivos testes genéticos, negativos.

Se uso este meio, e o tenho feito com alguma irregularidade, é tão somente motivado pela “obrigatoriedade natural” de dar o meu testemunho, mostrar a minha gratidão e tentar ajudar aqueles que passam ou virão a passar por essa luta, muitas vezes inglória, mas sempre de muito valor.

Nesta travessia de sete anos, aprendi muito e descobri algumas ferramentas que gostaria de compartilhar em jeito de motivação.

1. Reconhecimento. Aprendi a reconhecer que estava doente e que não havia como dar a volta ao texto, ou seja a prioridade das prioridades era tratar-me. Interrompi um projecto profissional em que coloquei toda a minha capacidade e energia, 24/24 horas 7/7 dias, tive de deixar a minha terra, para onde regressara quatro anos antes, depois de nove maravilhosos anos em Miami. Aceitar que a frase “tu tens câncer” é real é pedra angular da cura, mas é fundamental saber que não é o fim.

2. Motivação. Identifiquei que tinha de encontrar uma motivação superior, pela qual teria de lutar. Encontrei-a nos meus filhos e na necessidade de acompanhar o crescimento deles, na minha esposa e família, e no propósito que, sabia, Deus tinha e tem para a minha vida desde que nasci.

3. Sintonia integral. Reconheci que a minha mente, a minha alma, o meu corpo, os meus objectivos e todo o meu entorno deviam estar em sintonia para que, juntos, "trabalhassem" para o mesmo fim. Não podia ter dúvidas na minha mente, enquanto entregava o corpo ao tratamento, ao mesmo tempo que a minha alma andava carregada de sentimentos contraditórios. Descubri que teria de procurar um ambiente positivo e confluente para a minha cura, colocando de lado até pessoas que pudessem levar-me a duvidar do caminho.

Neste ambiente saudável, a família desenvolveu um papel determinante, principalmente no aspecto psicológico. O doente não pode ser visto como condenado a morte, mas apenas um doente em tratamento, por isso, mais um da família e não o “coitadinho” que merece a pena de todos.

4. Actividade permanente. Nunca parei de trabalhar um único dia. Inclusive durante as sessões de quimioterapia, continuei a escrever, a fazer projectos e, nos últimos anos, a trabalhar diariamente. Cheguei a trabalhar com bolsas e tubos pendurados. Recomendo com quem tenho a oportunidade de falar, a manter o corpo e a mente ocupados, em projectos viáveis. A viver intensamente.

5. Nada de lamentar. “Por quê, eu?”, foi uma pergunta que nunca permiti que se alojasse na mente, mormente fazer morada na minha alma ou no meu espírito. Podia ter significado a morte do corpo. Chorei, sim, houve momentos de desânimo, quase me desesperei, mas lutei para não lamentar, recusei considerar-me condenado e refutei a ideia de que estava perante qualquer castigo divino. Admiti sim e assume que tinha de lutar, para poder vencer.

6. Tratamento radical. Desde a primeira hora, aprendi a escolher o tratamento radical. Onde foi possível cirurgia, preferi ir à faca do que passar por tratamentos outros como quimioterapia ou radioterapia. Apenas no primeiro câncer (bexiga) recebi quimioterapia, seguida de uma cirurgia radical. Nos outros três optei sempre pela cirurgia. Mais: depois de me ter sido retirada a mama esquerda, pedi para que fosse feito o mesmo com  a outra. Apesar de, nos exames, a mama direita ter aparecido como estando limpa, o facto é que, após a sua remoção, a biópsia comprovou que havia um câncer em desenvolvimento. Neste tipo de lutas, a estética é a última na escala de opções.

7. Fé inabalável. Aqui pode radicar a diferença para uma recuperação total e, no meu caso, acredito que a minha fé em Deus e o recurso permanente a ele através da oração, foram basilares  na minha cura. Para mim, mais do que os seis instrumentos acima citaods, houve um terceiro elemento nesta “trindade” final: o propósito de Deus e o pacto que temos. O ponto de partida continua a ser a fé e o pacto com Deus. Sem religiosidade, sem dogmas, sem rituais, sem sacrifícios, sem pagamento de dinheiro!


Conclusão: A frase “tu tens câncer” está longe de ser uma sentença e, caso o seja, há onde recorrer. Fé, Força e Foco funcionam. Vamos lá, guerreiras e guerreiros!

domingo, fevereiro 04, 2018

A gestão da espera


Há dias lancei esta questão num post no Facebook e disse que regressaria ao tema. 

Dedicatória: No Dia Mundial da Luta Contra o Câncer a todas as guerreiras e guerreiros, uma história verídica.

De criança, bem pequeno, os mais chegados chamavam-lhe “Vai”. Ninguém sabe por quê. Nem ele mesmo. E nunca perguntou.

O ano de 2017 não foi dos melhores para Vai. Foi duro, em todos os aspectos.  Para complical, em Setembro começou a sentir alguma fraqueza física e cansaço anímico. Mas continuou a trabalhar e a levar a vida normalmente.

Em Novembro, Vai pensou que essa fraqueza, cada vez mais acentuada, poderia estar ligada à época da gripe e tomou alguns dos tradicionais remédios, de farmácia e “da terra”. Mas nada. Como nos primeiros dias de Dezembro tinha a sua consulta anual, esperou pelos exames. Os resultados não foram de todo bons.

Os níveis de açucar dispararam para perto dos de um diabético – sem o ser -, as enzimas no fígado aumentaram de forma assustadora, os exames indicaram alguma anomalia nos rins. Vai perdeu cerca de sete quilos em três ou quatro semanas.

Passo seguinte foi fazer um CTScan (TAC) que indicou haver um “tecido suave”, exactamente no local onde lhe tinham extirpado um câncer há mais de três anos, mas o radiologista não pôde confirmar se era maligno ou benigno. O cirurgião apontou um caminho e enviou Vai para um especialista em gastroenterologia, para desbloquear o conduto biliar e permitir a circulação dos fluídos. Esse bloqueio era a causa do problema. 



Dúvidas e biópsias inconclusivas

O gastroenterologista, devido à anatomia e ao histórico de Vai, admitiu que podia ser câncer e o enviou ao radiologista para fazer uma biópsia. Antes de colocar qualquer cilindro ou anel, "há que saber com que estamos a tratar", disse o especialista.

O Natal não foi dos melhores. Com pouca energia, a opção foi passar mais tempo em casa. Vai não pôde ir aos concertos de Natal  de que tanto gosta nem passear pela cidade. Com uma dieta rigorosa devido ao nível de açúcar, ficou longe dos gostosos quitutes e goloseimas da época.

No terceiro dia de 2018, Vai foi submetido a uma intervenção cirúrgica de uma hora e 10 minutos para a introdução de um tubo que permitisse a circulação dos líquidos pelo conduto biliar. E fazer a biópsia. Ficou um dia no hospital, de onde saiu com um tubo no estômago que tinha de cuidar muito bem.

Menos de 48 horas depois, Vai passou a sentir-se bem e quatro dias mais tarde os níveis de açucar, enzimas e outros começaram a regressar à normalidade. Mas a biópsia tinha sido inconclusiva e oito dias depois, regressou ao hospital para uma nova intervenção. Para mais uma biópsia e para que lhe colocassem o tal cilindro ou anel. Mais uma intervenção de 70 minutos, com anestesia geral, e Vai regressou à casa com o mesmo tubo.



A espera valeu a pena

A biópsia voltou a ser inconclusiva. Agora, seria a vez do especialista sénior em gastroenterologia entrar em cena para ver, com uma câmera, o tal tecido, se era maligno ou não, e colocar o cilindro para abrir o conduto biliar. A espera foi de 20 dias e no dia da intervenção, a equipa de radiologia atrasou-se por uma hora. As duas equipas tinham de trabalhar juntas.

Depois da cirurgia, um dos especialistas veio trazer “boas notícias”, como ele próprio disse: não encontraram nenhum tecido, nem qualquer indicação de qualquer tumor e o que estava a bloquear o conduto era uma pequena pedra que foi removida. Mesmo assim, voltaram a enviar material para uma terceira tentativa de biópsia.

Vai regressou à casa tranquilo, como esteve em todo esse processo, mesmo quando a 5 de Dezembro um oncologista lhe avisou que poderia ser um câncer. Mesmo depois de dois dias após o Natal o gastroenterologista ter admitido que podia ser o regresso do câncer de pâncreas que ele teve há mais de três anos. Ou mesmo depois de um dos médicos presentes na segunda intervenção ter afirmado que para eles “era 50 por cento maligno e 50 por cento benigno”.



Esperar, saber esperar

Durante esses dois últimos meses, Vai teve de saber gerir a espera ou desesperar-se. No seu “manual de recursos”, ele puxou dos que a sua fé e experiência lhe ensinaram:

  1. Manter a sua fé firme em Deus e na promessa que recebeu em Setembro de 2014, depois de um exame ter dado células cancerígenas que, no entanto, depois… “desapareceram”, segundo os médicos: o milagre está feito. E se estava é porque está feito!

  2. Ter em mente que todo o processo tem um princípio, meio e fim, e um tempo determinado. O desespero não encurta o tempo, apenas complica o processo. O ser humano espera nove meses para nascer na perfeição. Antes, pode ser problemático. O próprio Jesus, que tinha poder para descer da cruz, esperou três dias para ressuscitar. Então, todo o processo é para ser vivido.

  3. Continuar a trabalhar e a fazer a sua vida da forma mais normal possível, contornando as limitações e evitando o que não podia.

  4. Manter a mente sempre ocupada e em alerta, focada no que ele pediu a Deus.

  5. Seguir os tratamentos e orientações dos médicos.

  6. Descansar e não "complicar" o trabalho de Deus. É hora d´Ele actuar"!

Nota final

O Vai da história sou eu, Álvaro, na verdade assim me chamavam em casa de criança. Alvarito veio depois.

Uma vez mais e sempre dou graças a Deus por mais um milagre, à família pelas orações e força, aos colegas de trabalho que me ajudaram, aos que têm orado por mim.

Neste Dia Mundial de Luta Contra o Câncer, deixo palavras de encorajamento, esperança e fé às guerreiras e guerreiros com esta história real.


A fé em acção faz milagres. Toca o coração de Deus!

domingo, outubro 08, 2017

No meu upgrade 5.4


 (É grande mas escrito com coração grato)

No Verão passado, quando visitei em Miami o meu amigo e antigo colega José A. Ceschin, ele recebeu-me, à sua maneira, com “e você ainda não morreu?”. Como bom ciroulo, respondi, de rompante também, “estou à espera que você vá primeiro”. Ele há dias completou 77 anos e com muita saúde.

A brincadeira dos dois só é aceitável entre amigos de verdade, que se querem,  e vem a propósito do mais recente controlo médico semestral, que realizei em Setembro, portanto, depois da tal visita.

Seis anos e meio após um intenso combate pela vida, os quatro especialistas que me atendem semestralmente desde que cheguei a Washington, em 2013, decidiram que  o controlo agora será anual.

Para eles, tudo está bem e os exames – quase sempre com recurso ao CTScan (TAC) – podem eles mesmos contribuir para o surgimento de cânceres. Alguns disseram que eu devo estar cansado dos corredores e consultórios do hospital e da cara deles, e que é tempo de descansar um pouco.

Nesse período, fui ao salão de cirurgias nove vezes, cinco delas para grandes intervenções, sendo uma de oito horas e meia e outra de sete horas e meia. Fui submetido a oito anestesias gerais e várias parciais. Entrei na máquina do CTScan (TAC) pelo menos 16 vezes (de que me lembre), furaram-me as veias inúmeras vezes porque elas são finas e difíceis de apanhar. Criol é fino, ou não?!

Não posso esquecer os cinco meses de quimioterapia em 2011, o processo todo e o que me disse o cirurgião que retirou a bexiga infectada por um câncer na fronteira do nível 2 e 3 e criou uma neo-bexiga: “a químio não funcionou porque tens um tipo de células que apenas possuem 2 a 3 por cento de pessoas no mundo…” E esta??!!

Vida normal

Neste momento, vivo sem cinco órgãos, o intestino delgado tem menos 50 centímetros (foram usados para construir a neo-bexiga) e parte do pâncreas foi retirado. Em Maio, estando em Angola, sofri uma trombose no olho esquerdo e, embora o especialista diga que não tenho mais sangue depois de três injecções no olho, quando deviam ser seis (o que para ele foi um milagre), fiquei com sequelas. A visão nesse olho é turva principalmente para perto. A outra sequela, mas da quimioterapia, é um certo formigueiro na parte de frente dos pés.

Levo uma vida “perfeitamente normal” apenas mais saudável, principalmente a nível da alimentação, mas sem qualquer dieta. Além do remédio de tensão – herança familiar –, em dose pequena e prescrita muito antes dessa jornada, tomo apenas um comprimido para evitar o refluxo e outro para me ajudar a reter a proteína dos alimentos no organismo, em virtude da retirada de parte do pâncreas.

Postura

No dia do meu upgrade para 5.4, ou lamento essa caminhada dura, que me levou a refazer o meu projecto de vida que pensei ser aquele que Deus tinha para mim quando regressei a Cabo Verde em 2008, os temores, medos e sofrimentos, ou levanto as minhas mãos e agradeço a Deus – primeiro, que tudo -, médicos e outros profissionais, família e amigos. Sem titubiar, agradeço a Deus pelo propósito que Ele tem traçado para a minha vida e para o qual decidiu preservá-la.

E enquanto cumpro o destino que Ele traçou assumo o desafio de dizer a todos que enfrentam situações do tipo ou ainda piores que há solução: Ela começa pelo exercício da fé em Deus, não de rituais religiosos, práticas meramente denominacionais ou sacrifícios e promessas…

O exercício da fé nasce de uma certeza que Deus pode mudar a história natural e esperar pelo milagre sempre. E actuar, porque Deus nunca faz aquilo que é nossa missão: ter uma atitude positiva, viver cada dia intensamente, amar a vida e as pessoas, manter uma dieta saudável e seguir os tratamentos médicos. Ao contrário do que pensam muitos que seguem a Bíblia.

A própria Bíblia conta a história de um comandante sírio, Naamã, que procurou o profeta judeu Eliseu devido a uma doença terrível de que padecia. O profeta mandou-o nadar sete vezes num rio, que para ele era sujo, o que o levou a hesitar. Depois, decidiu seguir o “tratamento” e foi curado. Não basta apenas crer, há que actuar.


Muitas vezes me perguntam se não não tive medo, temores, dias muito maus, dias desesperantes, noites em branco… Claro, mas faço o caminho de volta, o que descrevi nos parágrafos anteriores.

Um agradecimento, também, aos profissionais, à minha família (a mais próxima e a mais distante) e a todos os amigos pela ajuda e força nesse período.


Agora, as três meninas preparam o “breakfast” como dizem e mais tarde uma "voz" me revelou que há uma feijoada, portanto haja festa rija. É que amanhã começa a contagem para o upgrade 5.5.